quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Sintonize sua vibração


A música recomenda “sintonize sua vibração, não há tempo para viver em vão”. Na letra é poesia, mas na prática tenho visto pessoas desperdiçando tempo e energia com o pólo negativo das situações. 

Não sei se você é daqueles que compartilham tragédias, assaltos, mortes, o kit completo do caos. Se faz isso nas redes sociais, nas esquinas, em casa, no bar. Se desfere acusação e palavrões por aí (embora nada como um palavrão quando batemos o dedo na quina da cama). O alerta que nos cabe é: Podemos estar nos distraindo do nosso foco real nesta vida – ser feliz!

Ouvi um palestrante, terapeuta e estudioso de neurociências, dizer que nosso cérebro pode se viciar no sofrimento e que é preciso quebrar esse padrão para atrairmos a prosperidade. Sugerindo exercícios simples, ele nos convidou a dar curto circuito nos pensamentos negativos e a chacoalhar essa fixação que alguns (ou nós mesmos) temos, de tempos em tempos, de mirar na praga, na notícia ruim.

Ser generoso com a nossa vida requer disciplina. Precisamos quebrar o modus operandi prejudicial da mente. Quando avistarmos algum indício de baixa frequência, que tal pensarmos em algo inusitado? “Imagine um elefante amarelo”, dizia o palestrante. “Ou um fusca voador”, brincava ele. Qualquer ideia que ajude a mudar o ritmo interno de pessimismo é bem-vinda.

Mas o que nos leva a compartilhar o negativo? O que faz as pessoas se reunirem em torno da prosa de babel? Fico imaginando como é aquela vida que se alimenta de tragédias. Talvez a pessoa acredite que não mereça a felicidade, que não seja possível seguir um fluxo leve, já que sempre haverá um problema a ser resolvido.

Pode ser que, em algum momento do passado, o indivíduo cristalizou a sensação de menos valia, de que “não é capaz, bom o suficiente”, ou de que “a vida só dá certo se for com muito sacrifício”. Afinal, “nada veio de mão beijada”. E quando adulto, mesmo em outro contexto, a voz da criança assustada ainda lembra aquele episódio congelante e faz a pessoa recuar. Aí a vida fica vai ficando demais e a felicidade já está em outros planos.

Há pessoas que funcionam como ímãs para a confusão. Se regozijam com a desgraça alheia e até a própria. Talvez para elas os problemas tragam um sentido de utilidade. Precisaram ser fortes a vida inteira e não seria agora que aposentariam a armadura. Pois veja, é preciso ficar a postos para apagar os incêndios, para “ajudar os outros”, que não sabem se virar sozinhos.

O que esses cavaleiros não se lembram é de que há vezes (para não dizer sempre) em que precisamos lidar com nossos próprios entraves. Nossos monstros sagrados nos revisitam até perdermos o medo e evoluirmos. Se o outro faz por nós, no intuito de nos ajudar (mas no fundo nos julgando incapazes), quando cresceremos?

Talvez seja perturbador levar os dias com mais alegria e prazer, deixando que o vizinho amadureça por si. Ora, nosso quintal está verde e o do vizinho em chamas. “Estou muito ocupado resolvendo problemas”, é resposta recorrente para uma casta.

Por sorte, dentro de nós habita uma chave de ignição, nosso motor de combustão interno que nos impulsiona para fora do círculo (des)confortável da negatividade. E sempre é tempo de virar essa chave, mas caso esteja enguiçada, deixo aqui uma instrução útil, a depender do modelo do seu “carro”.

Como consertar uma chave de ignição que não gira?
Uma chave de ignição que não gira pode ser frustrante e um desperdício de tempo. E esse é um problema mais comum do que se pensa. Há várias possíveis razões para a chave não girar, e algumas delas podem depender bastante do modelo do seu carro ou de alguma situação específica que esteja acontecendo. No entanto, existem estratégias simples bastante usadas para combater as principais causas de isso acontecer, e vale a pena tentar usá-las antes de recorrer a pedir ajuda na estrada.”

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Onde está sua alma?

Outra noite, um amigo nos dava conselho sobre um trabalho: “Façam com a alma”. Uma rica sugestão, diria, que se estende para as decisões afora o âmbito profissional. Optar por aquilo que faz o coração vibrar traz mais sabor e temperatura à vida. É atraente e furtivo. Mas desde então, a pergunta não me sai da cabeça: “Por onde anda minha alma?”

Reunir mente, corpo e alma em um só lugar não é tarefa simples. Em geral, nosso corpo samba aos quatro ventos, enquanto a mente vagueia entre o passado e o futuro e a alma navega marota por águas indomáveis. As três ilustres juntas, ah isso é pura magia! Ou poderia se chamar presença.

Quem não passou por isso? O corpo chegou ao trabalho, mas a mente ficou lá na cama, convidativa, quentinha, espalhada entre travesseiros e edredom. Você vai passear, mas esqueceu de levar a alma junto, e o tédio não é mais uma novidade. O corpo, este faz as vias necessárias para garantir sua agenda, afinal há compromissos. Já a alma, essa é fugaz, incapsulável. E o que dizer da mente? Espécime escorregadia que, de vez em quando, se exibe para nos trazer à realidade.

Ambiciosas, a mente costuma projetar ao passo que a alma sonha com o impossível, aquilo que o corpo ainda não alcançou. Fica então uma ranhura. Se desejam algo diferente, há um esvaziamento, ou uma tensão. É necessário iniciar um conluio, uma negociação travessa. Enquanto isso o corpo espera, ou então adoece, o que não é incomum.

É difícil admitir quando não vibramos mais com algo. O que fazer? Assumimos uma derrota? Mas há luto ali, não se pode negar. Uma luta também, porque deixar o desejo fugir, cabe um desapego. Estava tudo tão certo, sossegado… Agora falta ar naquele espaço onde as dúvidas ocupam mudas.

Sabe quando o incômodo grita pelas manhãs, e você procura silenciar mente e corpo? Quer dizer para a alma não se rebelar àquela hora do dia, mas ela decide ter luz própria. Há turnos que são assim e a gente atravessa fácil. Outros, no entanto, trazem um cansaço, vontade de se render e acomodar.

E sobre o que meu amigo vinha aconselhando lá no começo, fazer com a alma? Dia desses minha alma deu o ar da graça. Tentei convencê-la a ficar, mas a criatura não se seduziu. Pediu por conquista e eu nada pude prometer. Não pude garantir que andaria de mãos dadas com o corpo, ou que teria horário livre com a mente. Estes são afoitos e volúveis. Não há controle.

Para marcar um encontro com a alma, há que se ter paciência e atrevimento. Namoro à distância, sem falsas promessas, porque ela é matreira. Sabe antes de nós o que acelera o peito. A tal sugestão de “fazer com a alma” é uma atitude de entrega e inocência. Uma conexão com nossos talentos, com aquilo que oferecemos para tornar o mundo melhor. Já se pode ver que a figura é mesmo ilustre, essa dita cuja.

Da última vez que minha alma me fez uma visitinha mais demorada, tomamos café (algo que fazemos bem), papeamos sobre sonhos e curvas. A mente puxou uma cadeira, se interessou, mas de pé atrás (como é de costume), cortou o pão pela metade e nos ponderou. Disse que os tempos não estão para brincadeira. O corpo bateu à porta, sempre chega assim, inadvertido. Pediu uma xícara e comeu bolo com leite.

Animados, marcamos outra rodinha de conversa, a qualquer domingo. Pode ser, foi ótimo, sabe como é… Quem virá? Nunca sei. Mas já deixo a postos uma mesa e um bloco de notas. Dicas valiosas vêm com esses encontros surpresas. Naquela tarde, ficamos nós quatro e uma longa conversa, saboreando pão, café e possibilidades.

Texto originalmente escrito para a coluna do blog Repórter Entre Linhas.


sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A arte de chupar mangas

Lembro-me de uma vez que eu e meu amigo, escudeiro de infância, fizemos um campeonato para ver quem comia mais manguitas. Aqueles frutos pequenos e azedinhos, que a gente amassa e morde só a pontinha para sugar toda a polpa. Na época, cada um passou de dez manguitas. Era à tarde, e a mangueira do quintal lá de casa dava uma sombra fresquinha. 

Venho de uma família que chupa mangas. Minha vó, mãe, pai, tios, todos chupavam e ainda chupam mangas. Coité, espada, jasmim, rosa, tommy, bourbon, todas têm seu valor. Espada era a preferida da minha Avó e coité a do meu Avô. Eu ainda gosto mais das menores, dá para comer várias.

Cortar a manga de garfo e faca aqui não tem lugar. A arte de chupar mangas requer envolvimento e coragem. Sabe aquele espírito livre, que suja as mãos e se enche de fios entre os dentes? Que se lambuza roendo até o caroço? Pessoas assim, dispostas a chupar mangas, definitivamente não têm medo do ridículo e saboreiam a vida lambendo os beiços. 

Nem todas as mangas caem do pé, é verdade. Algumas há que colhê-las. Mas na minha visão, onde há mangueiras, há sempre prosperidade. Imagine o pé carregado, umas maduras, outras verdes, convidativas, se exibindo frutíferas e ricas. Um primor.

Um bom pé de manga nos acorda para a generosidade da vida. O balde cheio nos lembra como é bom compartilhar. Dezembro traz esse clima coletivo, é a safra da manga. Minha mãe tem aparecido mais vezes, com baldes cheios da fruta. A geladeira repleta, cheirosa, traz uma sensação de riqueza e saúde.

Adoro levar mangas para os amigos. Uma delicadeza que satisfaz meu espírito criança. Imagino todos eles de mãos amarelas, com o suco esparramando pelo prato, escorrendo pelo braço, colorindo a alma.  

No mundo, já foram reconhecidas mais de 1.600 variedades da fruta. Haja sabor! A India é o habitat natural e a manga teria chegado ao Brasil pelas mãos dos portugueses. O fato é que já somos um dos maiores produtores no mundo, levando essa delícia a barrigas alheias.

A mangueira frondosa lá de casa, quando eu era pequena, provocava aconchego e segurança. Bastava ir lá no quintal e olhar para cima, ver o céu tapado de folhas, respirar o ventinho que corria pelas brechas dos galhos. Pronto, estava tudo explicado para mundo criança.

Hoje não há mais a casa, nem a mangueira e os outros pés de fruta, plantados pelas mãos milagrosas de minha Avó. Mas essa época me vem facilmente à memória, com as mangas que chegam pelas mãos de minha mãe.

Chupar mangas é uma surpresa. A gente se suja, perde a preguiça, esconde o medo, derruba o caroço, fica sem jeito, dribla as regras. E saboreia a vida de boca cheia.


sábado, 12 de novembro de 2016

Repare. Vem um sujeito dirigindo na sua frente, devagar quase parando, testa sua pouca paciência, quando lá pelas tantas escolhe o caminho diferente ao que estava indo. Aí você se pergunta: Por que raios a criatura veio como tartaruga bloqueando o trajeto até aquela bifurcação? Por que apenas não deixou você passar e saiu da frente? Mas assim ocorre no trânsito, assim ocorre na vida.

Não raro insistimos em seguir numa via que não vai nos levar ao destino desejado, enquanto estamos ocupando um espaço precioso e mais útil para um terceiro, de forma deliberada ou não. Pode ser um posto de trabalho (porque não está fácil para ninguém), um local na fila, uma vaga no estacionamento, uma consulta que não vamos, um parceiro que não amamos, até uma amizade que não engrena.

Mas o que poderia acontecer se passássemos adiante o que não tem mais funcionado em nossa vida? O “não te quero, mas não te largo” é poesia de botequim. Mas até o botequim tem suas regras. O apego é dedicado aos garçons e à mesa cativa. Já os pratos e as companhias…

Observando o trânsito, noto ainda outros volantes. Tem a pessoa que não vê nada mais além do próprio carro. Não dá passagem a ninguém e puxa a direção para a direita ou para a esquerda sem a menor cerimônia. É o conhecido “dono da rua”, da razão, da roda de conversa, da vida dos outros.

Conhece o apressadinho? Apesar de toda agilidade, esse perturba. Buzina, corta os demais carros mesmo quando não há espaço, procura sempre uma brecha para tirar vantagem, passa por cima de 
veículos, buracos e pessoas. Para esse estilo, a vida do outro passa ao largo da sua urgência pessoal.

E o que dizer dos desligados? Aerados, avoantes. Esses seres de outro planeta não dirigem, flutuam, e lá fora mísseis e engarrafamentos desabam no céu de algodão. Seguem em outra galáxia chamada lentidão. São desorientados? Tranquilos? Quem descobrir avisa dez esquinas lá atrás. Mas por favor, criaturas mágicas, mantenham-se à direita da pista.

Os espaçosos também merecem destaque, vivem sob uma ótica diferenciada, dirigindo numa faixa imaginária, a do meio. Lá na frente um carro vai convergir à esquerda e você pensa estar atrás de um caminhão. Ah não, é só um veículo de passageiro que ocupa quase toda a pista para fazer a manobra. Esquece que ali cabem dois carros, dez cavalos, uma avestruz e um papagaio.

Os nervosinhos são um caso à parte. Vivem atraindo confusão no trânsito, em casa, no trabalho. Colecionam alguns acidentes e sempre têm um causo para contar. Vivem no ponto, ponto de bala, do pau e da pedra. Reúnem aventuras que doem no bolso e pesam na lataria do carro. Nesses casos, melhor fazer como um amigo meu, também esquentadinho. Coloca uma música zen e, se algum problema te perseguir, sorria com um “namastê” e um “siga em paz”.

Toda semana cruzo com pelo menos um de cada naipe. Na minha vez de apressadinha, saio cortando caminho e o bom dia. A depender do período do mês, posso ficar avoada ou a nervosinha. Mas em qualquer situação, mantenho a pose e guardo a perda de compostura de vidro fechado. 

Originalmente escrito para a coluna quinzenal no blog Repórter Entre Linhas.