O discurso de Madonna, durante a
premiação na qual foi eleita pela Billboard como “Mulher do Ano na Música em
2016”, trouxe confissões e empoderamento. A cantora abordou situações íntimas e
os desafios da carreira como pop star e mulher. Enquanto respirava profundamente
em algumas memórias, seu olhar parecia revisitar o passado. Imagino que passou um
filme em sua cabeça naqueles dez minutos de discurso. Entre as mensagens
pungentes, declarou: “Na vida, não há segurança de verdade, exceto crer em si
mesmo”.
Além das palavras precisas, me chamaram
atenção as pausas de Madonna. Aqueles breves segundos em que ela respira,
sente, olha cortando o ar, e retoma a fala. Vejo a plateia prender o fôlego. Um
silêncio palpável, emocionado, constrangedor.
Quando se referiu aos apelidos
que recebeu - “vadia”, “bruxa”, “pactuante com o Diabo” - confessou ter ficado
paralisada. “Levou um tempo para que eu me recompusesse e continuasse com minha
vida criativa; para que eu continuasse com minha vida”. Com a voz embargada, explicou
ter encontrado conforto na poesia e na música.
Mais uma pausa. Madonna respira,
olha para baixo e desabafa: “Eu me lembro de desejar ter um modelo feminino a
quem eu pudesse procurar por apoio”. Outra grande pausa, agora maior, seguida
de uma respiração curta e forte.
Naquele instante pensei sobre os
modelos femininos que recebemos ao longo da vida – mães, professoras, tias,
artistas como a própria Madonna, amigas, vizinhas, e até desconhecidas. Pensei
nas ausências. Recordei o quanto desesperadamente nós mulheres, em fases
distintas, precisamos de um apoio, de uma palavra amiga, de uma referência,
seja de sucesso, de confiança, projetando o feminino de fora para dentro, para
que possamos acessar nosso próprio potencial, sem culpa.
Naquela pausa senti a solidão de
Madonna, e de tantas outras mulheres que buscam uma direção fora para ter força
e coragem de se ver por dentro. O quanto ainda meninas queremos o olhar gentil
nos apontando o caminho, nos dizendo que tudo bem em sermos nós mesmas, que há
beleza e perfeição em nós. Que ter intuição não é fraqueza e se emocionar é sinal
de que estamos vivas, e principalmente, que não precisamos embrutecer para
ocupar nosso lugar no mundo, apesar dos infindáveis desafios que virão. Apenas
um sopro de gentileza sobre nossa face pueril.
Sem ter a dimensão exata (acho
que nunca se terá) do papel que nós mulheres desempenhamos umas para as outras,
perdemos oportunidades de fortalecer o feminino. O ser mulher que há em nós nem
sempre saúda o feminino que há no outro. Nossas pequenas brigas e competições
enfraquecem nosso caminho, quando poderíamos nos olhar com mais compaixão e delicadeza.
E haverá ainda tantas portas a atravessar.
“O que eu posso dizer sobre ser
mulher?”, questionou Madonna na cerimônia. “Não há regras, se você é um homem.
Se você é uma mulher, você precisa jogar o jogo”. Uma realidade do mundo
pós-moderno, com ou sem estrelas. E Madonna complementou: “Envelhecer é um
pecado. Você será criticada, você será a vilã”.
De Madonna às mulheres de todos
os dias, me pergunto se não precisamos de mais referências femininas, neste
mundo de avanço masculino. Lembro um comentário outro dia, em um desses vídeos
que passam pelas redes sociais. Se você não vê uma mulher em posições de destaque,
de sucesso, à frente de algo importante, é como se confirmasse internamente a
crença de que ela não é capaz.
Como inspiração para 2017, deixo
aqui a mensagem final de Madonna, eleita a “Mulher do Ano da Música em 2016”: “Enquanto
mulheres, devemos começar a apreciar nosso próprio valor e o valor de cada uma.
Busquem uma mulher forte para ser sua amiga, para se alinhar com ela, aprender
com ela, para ser inspirada, para colaborar, para apoiar, para ser iluminada.”