Dizem que era um anjo, “a melhor
pessoa que já conheci”, um exemplo de generosidade, de uma bondade única, um
amor de Ana. Assim é definida minha tia, Ana Teresa Fontenele, por familiares,
amigos e conhecidos.
Entre algumas memórias que guardo,
estão as viagens que fazíamos à praia e ao clube. Recordo dela sentada numa
cadeira, à beira da piscina do clube militar, junto a seu irmão mais novo,
olhando a mim e a seus filhos (meus primos) enquanto arriscávamos mergulhos.
Na minha pouca idade desejava
aquela tia paterna para o posto de minha mãe. Perto dela, eu existia, era
cuidada, era seguro. Ela me via. No íntimo, eu me questionava por que eu não
poderia ser filha dela, por que eu não tinha nascido daquele ventre, onde a
família seria mais fácil e amorosa. Delírios de infância.
Tia Ana é uma daquelas pessoas
com breve passagem pela terra, mas com um longo caminho de benfeitorias,
principalmente a bondade inquestionável que distribuía a leigos. É um daqueles
seres cuja boa reputação a precede em muito. Já conheceu alguém assim? Dizem
que só em estar ao lado dela, já era tranquilizante, pois transmitia a certeza
de dias melhores.
A vida a levou para outros planos,
aos 32 anos de idade. O CA de mama roubou a mãe de dois filhos, cinco e três
anos à época, uma esposa muito amada e privou a família de um coração gigante. Em
agosto desse ano, completaram três décadas de sua partida. Eu tinha quase oito quando se foi, três dias
antes do meu aniversário.
Na lembrança, vejo um quarto com
uma luz à penumbra, um corredor misterioso para aquela criança que começava a
vida, enquanto a tia amada se ia. Em um certo momento, me disseram para fazer
companhia aos meus dois pequenos primos, porque algo tinha acontecido. Tia Ana
não estava mais ali.
Injustiça é o que sentem alguns
quando pensam no seu desfecho. Mas para Ana não houve fim, não houve o último
ato, a trajetória dela continua, inspira e nos ensina. Mesmo à distância, é
referência de altruísmo, de doçura e de humanidade. Um ser que veio a este mundo e deixou sua marca. Sua vida nos lembra que não há
medida para o amor.
Em homenagem aos seus 30 anos de
saudade, seus filhos criaram a Campanha Amor de Ana, com o objetivo de arrecadar produtos
diversos (higiene pessoal, roupas, cestas básicas) para a Associação Toque de Vida, que assiste mulheres mastectomizadas. É o amor de Ana que se perpetua, apesar
da finitude deste corpo.
Ana Teresa virou nome de rua, de
campanha, de união, de solidariedade. Três letras que também representam
desafio, coragem e superação. O legado de Ana se mostra além da vida e da
morte. Continuam seus feitos, “uma pessoa do bem, de luz”, diz uma irmã
emocionada; persiste sua pureza, revelada pelos diversos admiradores.